“Nesse Dia Nacional de Lutas pela Reforma Agrária, simbolizado pelo Monumento das Castanheiras Queimadas precisamos refletir, diante daquele signo fincado na terra de Eldorado, sobre os rumos dos movimentos, suas formas de luta e sua unidade”
Chegando a Eldorado de Carajás rumo ao Sul do Pará, à margem direita da BR-155, na Curva do S, avista-se um monumento diferente carregado de simbolismo: um agrupamento de imensos troncos de castanheiras queimadas fixos na terra. Região de castanhais, dizimados para a formação de pastos, o castanheiro ou vira madeira de exportação ou resiste de pé ao fogo sem tombar. Assim, a dor e a esperança esculpiram de forma singela a inquebrantável vontade de lutar e a necessidade de unir na luta.
Nesse lugar, há 25 anos, cerca de 1.500 trabalhadores sem-terra marchavam pacificamente para a Capital, Belém, em busca de seus direitos inalienáveis de possuir chão para plantar e viver; quando foram encurralados e atacados por 155 policiais militares vindos de Marabá e Parauapebas sob o comando do coronel Mário Pantoja e o major José Maria Oliveira, no governo do tucano Almir Gabriel. Tiros de fuzil e de metralhadoras, bombas, perseguições seguidas de execução sumária consumaram em duas horas o massacre, no final da tarde de 17 de abril de 1996. Em uma área sem maiores refúgios foram chacinados 19 camponeses e 79 ficaram feridos.
O Massacre de Eldorado de Carajás pelo tamanho e comoção repercutiu internacionalmente proporcionando reflexos imediatos no país e no movimento. O ministro de Agricultura do governo FHC, Andrade Vieira, pediu demissão naquela fatídica noite; o comandante das tropas teve prisão domiciliar decretada; a Via Campesina definiu o 17 de Abril como o Dia Internacional de luta pela terra; FHC decreta o Dia Nacional de luta pela Reforma Agrária e o MST inicia a Jornada Nacional de lutas por Reforma Agrária. Enfim, a fazenda “Macaxeira”, objeto de disputa com o latifúndio, foi desapropriada transformando-se em Assentamento “17 de Abril”.
As chacinas e as execuções são historicamente métodos arcaicos, praticados pelos pretensos donos do mundo, todas as vezes que se sentem ameaçados em seus domínios. São inúmeros e diversos no tempo como a mortandade de índios e negros, Tiradentes, Canudos e Contestado, Guerrilheiros do Araguaia, Corumbiara (RO) e Pau D’Arco (PA). A sanha do latifúndio destruiu e queimaram barracos, plantações e posseiros; assassinou lideranças como o “Gringo” e Pe. Jósimo, João Canuto e filhos, Paulo Fonteles, João Batista e Chico Mendes, Expedito Ribeiro, Margarida Alves e Irmã Dorothy, Dezinho e Carlos Cabral entre tantos.
Segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT), que desde 1985 realiza o levantamento dos conflitos no campo e seus desdobramentos, 92% das mortes por disputa da terra seguem sem solução; de 1996 a 2019, 320 lideranças e trabalhadores foram assassinados; 1.213 ameaçados; 1.101 presos pela polícia; 30.937 vítimas de trabalho escravo; e 37.574 famílias despejadas. Só em 2019 ocorreram 1.833 conflitos (+23%/2018), maior número em 15 anos. Observamos a impunidade de 1.500 assassinatos desde a redemocratização até 2018, quando menos de 100 casos foram julgados. Eis o triste retrato da violência e do descaso que atingem o povo do campo.
A eleição de Bolsonaro foi a vitória dessas forças do atraso, do latifúndio e sua descendência iletrada e boçal. Com o genocida instituiu-se o patético “Dia do fogo”; os “grilos” de terras públicas foram legitimados; ampliaram-se os conflitos e a violência contra os trabalhadores rurais, os sem-terra e os índios, agora estimulado e sob proteção oficial; liberaram armas e autorizaram matar; protegem garimpos clandestinos e madeireiros ilegais. Esse presidente anti-reforma agrária, anti-trabalhador, anti-índio, anti-quilombola, em plena pandemia, vetou os artigos da lei 14.048/2020, que davam apoio financeiro aos produtores rurais familiares, que prorrogavam dívidas e ampliavam linhas de crédito para a agricultura familiar; sucateia o INCRA, o ICMBIO e o IBAMA. Ao outro lado, deixa “passar a boiada”.
Nesse Dia Nacional de Lutas pela Reforma Agrária, simbolizado pelo “Monumento das Castanheiras Queimadas” precisamos refletir, diante daquele signo fincado na terra de Eldorado, sobre os rumos dos movimentos, suas formas de luta e sua unidade. Aprender com as experiências seculares da luta do povo, suas inúmeras conquistas e retrocessos; contabilizar os saldos, considerando o período de governos progressistas. Pois a morte de milhares de lutadores e a energia de milhões que continuam na batalha não podem ficar em vão. Portanto, parabéns a todos que lutam, e avançar na luta é o caminho.
A reforma agrária é uma bandeira presente e necessária, que precisa ser entendida para os dias de hoje, no atual estágio do país. Libertar o Brasil do latifúndio improdutivo e de formas de pouca produtividade de riquezas; incluir os pequenos e médios camponeses, os trabalhadores rurais e os Sem Terra no circuito produtivo do campo, que garanta a segurança alimentar dos brasileiros, com crédito e mercado assegurados são passos significativos para o desenvolvimento nacional e para a democracia.
Basta de genocídio! Punição aos crimes do latifúndio! Reforma Agrária já!
Fonte: O Vermelho