Somente uma grande mobilização popular, liderada pelos sindicatos e pelos movimentos sociais com apoio da oposição consequente, poderá vir a derrotar esse governo de destruição nacional.
A dissimulação é própria da sociedade capitalista que introduziu, pela via do fetichismo da mercadoria, a opacidade nas relações sociais estabelecendo a cisão entre a realidade e a aparência; entre o fato e o direito; e entre o material e o formal.
Compreende-se, então, que na luta política os representantes da classe dominante recorram à dissimulação enaltecendo seus feitos e escondendo suas mazelas nas disputas eleitorais. Mas, na fase atual em que o capitalismo, tendo se estendido por toda a terra e não tendo mais para onde se expandir, esgotou suas possiblidades e tende a colocar cada vez mais problemas que não é capaz de resolver mergulhando, assim, numa crise estrutural que coloca a necessidade de sua superação pela implantação de uma nova ordem social. Nesse estágio terminal, para além da dissimulação a própria mentira foi alçada explicitamente à condição de estratégia para a vitória eleitoral e como tática de governo. E é isto o que vem se evidenciando de forma escancarada no Brasil desde as eleições de 2018. Tais eleições foram vencidas por Bolsonaro por meio de uma estratégia de campanha eleitoral que espalhou largamente notícias mentirosas pelos diferentes dispositivos das redes sociais, entre os quais se destacou o WhatsApp. Conforme reportagem do jornal Folha de S.Paulo de 18 de outubro de 2018, a campanha de Bolsonaro contratou empresas de disparos de mensagens em massa que espalharam notícias falsas contra a candidatura do PT, em flagrante violação do artigo 222 do Código Eleitoral Brasileiro que define como “anulável a votação, quando viciada de falsidade, fraude, coação…”.
Tendo assumido o governo, a mentira foi alçada à condição de tática governamental estruturando-se mecanismos, como o “gabinete do ódio”, que sistematicamente se dedicam a espalhar mentiras para desqualificar os adversários, tratados como inimigos a abater, e atribuir ao governo ações dos opositores que beneficiaram em algum grau a população. O próprio presidente Bolsonaro é um mentiroso contumaz. Teve o desplante de afirmar, em 23 de julho, um dia depois da aprovação da PEC do Fundeb, nas redes sociais, que “o Executivo mostrou responsabilidade na aprovação do Fundeb, no dia de ontem. Então, o PT ficou 14 anos no poder e não fez nada. Ou melhor, via método Paulo Freire, nos colocou em último lugar no Pisa [Programa Internacional de Avaliação de Estudantes]. E o governo conseguiu ontem mais uma vitória, aprovamos o Fundeb e o Senado deve seguir o mesmo caminho”. Ora, o governo tentou, à última hora, transferir a validade do novo Fundeb para 2022 e desviar recursos do fundo para o programa que está se propondo a criar em substituição ao bolsa família; e os sete votos não favoráveis à aprovação da PEC foram de aliados do presidente, pertencentes, seis ao PSL e um ao PSC, partidos que o elegeram. Vê-se como ele mente duplamente, assumindo como vitória sua aquilo que foi uma derrota e acusando o PT quando foi este partido que criou o Fundeb substituindo o Fundef, ampliando seu alcance assim como os recursos do fundo. Seria muito longo nomear neste artigo cada uma das mentiras do presidente. Basta registrar que vem tendo a desfaçatez de mentir descaradamente em pronunciamentos na ONU dizendo que o Brasil preserva o meio ambiente e que somos o país que melhor enfrentou a pandemia do coronavírus, quando é de pleno conhecimento internacional a devastação da Amazônia, do Pantanal e do Cerrado promovida pelo atual governo assim como o comportamento de Bolsonaro que age muito mais como aliado do vírus do que no combate à pandemia.
Enfim, a constatação mais preocupante é que não apenas a mentira se converteu em estratégia eleitoral e tática de governo, mas tal contrafação da democracia vem tendo êxito. Com efeito, a estratégia da mentira foi responsável pela eleição de Bolsonaro e mediante a tática mentirosa o governo vem convencendo a população, como mostra pesquisa Datafolha realizada nos dias 8, 9 e 10 de dezembro de 2020: os que consideram que Bolsonaro não é responsável pelo agravamento da pandemia eram 47% em agosto e em dezembro são 52%. Apenas 8% acreditam que Bolsonaro é o principal responsável. O negacionismo é uma postura repetidamente adotada pelos agentes governamentais e, embalado em mentiras, se difunde junto à população. Agora vem à tona uma denúncia de 36 cientistas que se dispuseram a prestar assessoria ao Ministério da Saúde, informando que seus nomes constam do plano de vacinação que o ministério encaminhou em consequência de exigência do STF e eles sequer foram informados sobre o conteúdo desse plano. Ou seja: o Ministério mente ao atender a uma intimação do STF. Logo, a mentira está institucionalizada como diretriz governamental.
Como sair dessa enrascada? Infelizmente, uma saída institucional está bloqueada em razão da pusilanimidade das instituições ditas democráticas. O Congresso Nacional, apesar dos 54 pedidos de impeachment que deram entrada na Câmara dos Deputados, não tomou nenhuma medida. E Bolsonaro, no velho estilo “toma lá dá cá”, mediante compra por meio da concessão de emendas parlamentares atraiu o chamado Centrão constituindo uma maioria como base de apoio parlamentar. O Tribunal Superior Eleitoral assim como o Supremo Tribunal Federal tiveram diversas evidências das ilegalidades cometidas pela campanha de Bolsonaro e pelas ações ao longo desses dois anos de governo, mas não tomaram as medidas cabíveis. Além disso Bolsonaro vem procurando colocar em postos chaves do sistema judiciário profissionais alinhados com seus interesses de modo a neutralizar as iniciativas de julgamento dos crimes cometidos por ele, pelos seus filhos e pelos membros do governo.
Enfim, somente uma grande mobilização popular, liderada pelos sindicatos dos trabalhadores de todas as categorias profissionais e pelos movimentos sociais populares com apoio dos partidos da oposição consequente, poderá vir a derrotar esse governo de destruição nacional.
Fonte: O Vermelho