Em Boletim de Conjuntura, Dieese avalia que incapacidade do governo Bolsonaro para lidar com a situação potencializou casos, mortes e queda do PIB.
No segundo trimestre de 2020, quando foi registrado um tombo de 9,7% do Produto Interno Bruto (PIB) comparado ao trimestre anterior, a economia brasileira chegou a um patamar 15,1% inferior ao registrado no início de 2014. O dado está no Boletim de Conjuntura Setembro/Outubro do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). No documento, o Dieese avalia que as ações governamentais até agora são insuficientes para a retomada necessária.
“A incapacidade do governo Bolsonaro para lidar com a situação potencializou o número de casos, mortes e a queda da atividade econômica. As micro e pequenas empresas seguem com dificuldades de acessar recursos públicos que deveriam manter a produção e também garantiriam a renda e o emprego dos trabalhadores. A falta de investimentos públicos impossibilita uma saída ordenada e consistente desse cenário adverso”, avaliam os técnicos da entidade no Boletim. O documento conclui que o país “poderia ter saído melhor” da pandemia.
O Dieese afirma ainda que, para uma recuperação econômica plena, seriam necessárias mudanças estruturais e de rota em relação às medidas que vêm sendo adotadas pelo governo. Destaca também que antes da pandemia o ritmo de crescimento já deixava a desejar.
“É preciso lembrar que a economia avançava meros 0,8% ao ano até o início de 2020, o que deixa claro que as reformas do atual e do governo anterior foram ineficazes para alavancar a economia e melhorar a vida da população. Muito se discute quando o país estará recuperado economicamente da pandemia, mas voltar ao nível anterior significa baixo crescimento e alto desemprego. É preciso ir além”, defende o documento.
Inflação de alimentos e insumos
Ainda de acordo com o Dieese, a política externa do governo vem prejudicando os fluxos de matéria-prima e a retomada da produção no pós-pandemia “A volatilidade do câmbio e a ausência de uma política econômica focada no mercado interno têm pressionado os preços de matérias-primas industriais e, sobretudo, os preços dos alimentos”, avalia o documento.
“Outro desafio à retomada é a escalada de preços ao produtor e ao consumidor. O Índice de Preços ao Produtor [IPP, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] da indústria de transformação acumula aumento de 6,5% em 2020 e a alta na fabricação de produtos alimentícios é de 12%. Os preços da cesta básica, pesquisados pelo Dieese, também concentram elevações significativas este ano, atingindo 16,2% em Salvador, 13,2% em Aracaju, e 11,5% em Recife”, diz a nota.
Auxílio emergencial e desemprego
O Dieese afirma que os resultados econômicos seriam ainda piores caso não houvesse o impacto positivo do auxílio emergencial de R$ 600, obtido após mobilização popular e das centrais sindicais, com apoio da oposição no Congresso Nacional.
“Vale destacar, inclusive, que parte do gasto das famílias, proporcionado pelo auxílio, retorna aos governos em impostos, isto é, o impacto fiscal líquido é menor. Nesse sentido, a redução do valor das parcelas para R$ 300 até o final do ano aprofundará os níveis de pobreza no país, diminuirá o montante de dinheiro em circulação e tornará ainda mais dramática a questão da fome no Brasil”, prevê o documento, ressaltando que a diminuição do auxílio levará à queda de consumo, o que retardará ainda mais a retomada econômica.
A economia brasileira será prejudicada ainda pela pressão do desemprego, que deve aumentar, destaca o Dieese. Segundo a entidade, o fato de um número significativo de pessoas não ter procurado ocupação, seja por medo da Covid-19, por acreditar não ser possível encontrar uma colocação ou porque precisava ajudar familiares ou conhecidos doentes, reduziu o contingente oficial de desempregados, mas apenas momentaneamente.
Reforma administrativa e Fundeb
O Dieese chama a atenção ainda para medidas do governo federal que considera prejudiciais ao desafio da retomada econômica. É o caso da reforma administrativa, que prevê acabar com a estabilidade da maioria das carreiras do serviço público. Para a entidade, esse redesenho do Estado deve reduzir investimentos e a oferta de serviços públicos, além de negligenciar ou eliminar políticas de combate às desigualdades e à promoção de direitos sociais.
“Resumidamente, a proposta [de reforma administrativa] visa precarizar a relação de trabalho do servidor público, em linha com as reformas trabalhistas do setor privado, que têm sido adotadas desde 2017. Ao se permitir a contratação de trabalhadores por meio de novos vínculos e regras, abre-se a possibilidade de rebaixamento de salários e dificulta-se a progressão funcional” afirmam os técnicos no Boletim de Conjuntura.
Para a entidade, entre os poucos fatores positivos no cenário político-econômico, está a aprovação do novo Fundeb no Congresso. Segundo o Dieese, a ampliação do fundo contribuirá para reduzir desigualdades.
“No Brasil, a ausência do Fundeb prejudicaria cerca de 99% dos estudantes de redes municipais no Norte e Nordeste”, diz o documento. O Dieese destaca, no entanto, que há itens do novo Fundeb que ainda precisam ser regulamentados, e, por isso, merecem atenção.
Fonte: O Vermelho