O coronavírus também causou queda de 76% nos licenciamentos de veículos, o que mostra que brasileiros não têm renda ou interesse em comprar carro em meio a uma pandemia. A simples reabertura de fábricas e comércio, como propõe Bolsonaro, não resolverá o problema.
Enquanto o governo de Jair Bolsonaro faz teatro e minimiza as mortes de quase 10 mil brasileiros, ao levar empresários para pressionar o Supremo Tribunal Federal pelo fim do isolamento social recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), a indústria nacional segue apresentando quedas recorde sem um programa de recuperação econômica efetivo.
O Pró-Brasil, um ensaio de plano de recuperação idealizado pelo ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, e encampado pelos militares, foi bombardeado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, que não admite estímulo público à atividade econômica.
Enquanto membros do governo batem cabeça, a produção nacional de veículos apresentou a maior queda da história. Com praticamente todas as fábricas fechadas, houve recuo de 99,3 % no último mês de abril, na comparação com o mesmo período de 2019.
O número foi divulgado nesta sexta-feira (8) pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) e mostra o impacto da pandemia do coronavírus na indústria, que começou a retomar as atividades com a reabertura de algumas unidades, de forma gradual No último mês foram produzidos 1.847 automóveis, comerciais leves (picapes e furgões), caminhões e ônibus, contra 267.561 no mesmo período no ano passado.
“É o pior resultado da série histórica da indústria automobilística desde 1957”, disse o presidente da entidade, Luiz Carlos Moraes. A queda também foi de 99% em comparação com março: o fechamento das fábricas como medida preventiva contra a pandemia começou no fim daquele mês.
A exportação de veículos em abril teve seu pior resultado em 23 anos. Chegou a 79,3% em relação ao mesmo mês de 2019 – com 7.212 unidades, contra 34.905. Quando comparadas com o mês anterior, março, as exportações caíram 76,7%. Já no acumulado, a redução foi de 31%.
Para a entidade, os números já eram esperados não apenas pelo impacto da Covid-19 no Brasil, mas também nos principais mercados importadores de veículos brasileiros – ou seja, a questão vai muito além do mercado interno.
A Argentina, o principal mercado importador, além da crise econômica enfrentada há algum tempo, tem as maiores medidas restritivas da região no combate ao coronavírus. Por isso, diferente do Brasil, o país vizinho registra um número baixo de mortes – 282. Quanto mais controlada a pandemia, maiores as chances de uma reabertura da economia.
Vendas
O coronavírus também causou uma queda de 76% nos licenciamentos de veículos, que foram de 231.936 unidades em abril de 2019 para 55.735 em 2020. Em comparação a março, com 163.625, a redução foi de 65,9%. Os brasileiros tiveram redução de renda e estão saindo menos de casa – portanto, não faz sentido comprar carro neste momento.
De acordo com a entidade, o Brasil é o 6º país com maior queda no número de licenciamentos no mundo comparando os meses de abril – desconsiderando a China, que não divulgou números.
Em primeiro lugar está a Índia, com 100% de queda, seguida da Itália, com 98%, e Espanha, com 96%. Em quarto lugar está a França, com redução de 89% e, em quinto, a Argentina, com 88%.
Empregos
Segundo a Anfavea, as montadoras recorreram às medidas do governo de flexibilização dos contratos de trabalho – com suspensão ou redução de jornada e salário – para manter os empregos no setor. “Estamos segurando os empregos por enquanto, utilizando todas as ferramentas disponíveis”, disse o presidente da entidade.
Pressão pela reabertura
O setor de automóveis é um dos que pressiona pela reabertura da economia em meio à pandemia. A Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave) afirma que 30% das concessionárias de veículos vão quebrar em 15 dias por falta de liquidez, caso não haja reabertura.
Resta saber se os brasileiros, em meio à queda na renda e aos temores da pandemia, estarão interessados em entrar em concessionárias para comprar carros. Vale lembrar que a MP 936, que permitiu a flexibilização dos contratos de trabalho, prevê desde a suspensão do salário até redução de até 70%. O complemento de renda que o governo oferece é calculado com base no seguro-desemprego, cujo valor máximo é R$ 1.813.
O governo de Jair Bolsonaro também tem se mostrado falho em fazer o auxílio emergencial de R$ 600 chegar às pessoas que necessitam. As enormes filas diante de agências da Caixa Econômica Federal retratam o desespero de brasileiros sem renda e com a saúde ameaçada.
Políticas mais efetivas
A preservação da vida e da dignidade dos brasileiros, bem como a retomada econômica, exigiriam políticas muito mais efetivas do que as que vêm sendo adotadas de improviso pelo governo.
Com a recessão à porta, não é o momento de reduzir renda dos trabalhadores. Além disso, o esforço de retomada não pode ficar só nas mãos do mercado privado como propõe Paulo Guedes. É necessário injetar dinheiro na economia em volume muito maior do que até aqui e fazê-lo chegar às mãos de cidadãos e empresas. Faz-se urgente, ainda, um planejamento robusto da ação do governo pós-pandemia. No entanto, o governo de Bolsonaro não parece capaz de entregar nada disso.
Fonte: O Vermelho