Rafael Paschoarelli explica a crise no cenário macroeconômico do Brasil, que atinge principalmente as camadas mais pobres ao reduzir seu poder de compra.
O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), inflação oficial do País, que terminou 2020 em 4,52%, agora já passa os 9%, considerando os últimos 12 meses. O valor explicita a rápida pressão inflacionária que vive o Brasil. Mesmo com o pico máximo apontado por especialistas não tendo sido alcançado ainda, a preocupação de uma inflação de dois dígitos já é real.
“Surpreende pela magnitude da inflação”, indica o professor de Economia, Rafael Paschoarelli, da FEA-USP. O economista ressalta o fato de no ano passado, quando o IPCM – considerado por muitos mais realista que o IPCA – era muito alto, defensores do governo diziam que a meta de inflação era medida por esse outro índice menor e “mais comportado”. Agora, com o IPCA descontrolado, chegando aos 9%, a meta da inflação para 2021, estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), que era de 3,75%, “dobrou e pode ser triplicada”.
Ao Banco Central, por sua vez, cabe a função de estabelecer a política monetária para que a inflação medida pelo IPCA fique dentro da meta do CMN. Dentro dessa estratégia monetária estabelecida pelo Banco Central (BC), encontra-se a regulagem da Selic, taxa básica de juros fixada para todo o País.
Com a Selic baixa (como aconteceu em 2020, que fechou o ano em 2%), investimentos dolarizados em títulos públicos brasileiros passam a não mais valerem a pena. A fuga de dólares causa inflação de certos produtos, como o petróleo. Soma-se a isso o aumento na conta de energia, cujo peso é considerável no cálculo da inflação.
“O Brasil tem uma capacidade ímpar de aprimorar as suas tempestades perfeitas, com o problema da taxa Selic que ficou muito baixa, o câmbio descontrolado, o preço das commodities em alta, a crise hídrica, etc”.
“A inflação atinge o rico, mas não muda nada o seu padrão de vida, quer a gasolina custe 6 ou 20 reais. Em vez de guardar uma quantia xis para investimento, ele vai guardar menos, sem mudar de padrão de vida. Já o pobre come menos, porque usa quase toda sua renda para alimentação. Ele não vai ter dinheiro para pegar o ônibus até o fim do mês”, demonstra Paschoarelli, lembrando que a alta da gasolina encarece serviços que dependem do combustível.
Vale lembrar que o aumento da inflação também é acompanhado do Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M), que avalia o preço de itens básicos no mercado e acumula alta de mais de 16% em 2021. “Essa desorganização bagunça a economia, gerando insegurança nas empresas e insatisfação nos empregados com salários defasados”. Ele citou o exemplo dos trabalhadores de Uber que vêm sua rentabilidade cair conforme o combustível do automóvel encarece.
“O que o mercado teme é a estagflação, ou seja, economia sem crescimento, mas com inflação”. Paschoarelli observa que alguns caem no canto da sereia de que uma pequena inflação não faz mal para o país, assim como “uma pequena gravidez”. “Cenários que o Brasil insiste em manter, mesmo sabendo que não deu certo no passado”.
Ele observa a condução desorganizada da economia pelo Banco Central esticando a corda dos juros e da política cambial que deprime o crescimento. O governo, por sua vez, com uma política fiscal que não reduz gastos porque o país precisa deles. “É o carro dirigido com os pés no acelerador e no freio ao mesmo tempo, andando com soquinhos, sem ir longe”, comparou.
Para ele, há um disparate, uma descoordenação, um discurso errático das autoridades do governo – “para dizer o mínimo” – não contribuem. O pior cenário para o futuro seria a inflação aliada à recessão de atividades econômicas e também alimentada pelos altos gastos públicos.
O otimismo do professor se expressou com a imagem dos vizinhos argentinos que, frequentemente, chegam a beira do precipício e se jogam, enquanto os brasileiros dão um passinho pra trás, sem se manter longe da beira.
Fonte: O Vermelho