MPF defende respeito à Constituição e aos direitos indígenas em debate sobre mineração na Amazônia.
Evento realizado pela SBPC ocorreu nessa sexta-feira (7), em Manaus; movimento indígena apresentou manifesto contra desrespeito a consulta e consentimento prévios em projetos que os impactem.
Em seminário temático sobre mineração na Amazônia, promovido pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) nessa sexta-feira (7), em Manaus, o Ministério Público Federal (MPF) enfatizou a necessidade de respeito à Constituição Federal e às leis, incluindo o direito de consulta e consentimento livre, prévio e informado de povos indígenas e comunidades tradicionais diante de qualquer ato legislativo ou administrativo com possível impacto sobre eles, previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e no Decreto 5.051/2004.
Diante de um grupo de pesquisadores, lideranças, movimentos sociais, estudantes, representantes de cooperativas de garimpo e pessoas com posições diversas em relação ao tema, o MPF criticou o recente envio pelo Poder Executivo ao Congresso Nacional do Projeto de Lei 191/2020, que regulamenta a possibilidade de mineração e grandes empreendimentos em territórios indígenas sem o devido cumprimento do direito de consulta nos moldes da Convenção 169 da OIT. O projeto, segundo o MPF, afronta ainda o artigo 231 da Constituição Federal, que garante o usufruto exclusivo de seus territórios, bem como o direito à proteção de seus costumes e tradições.
Ainda na mesa de abertura do seminário, lideranças indígenas Mura relataram os impactos vivenciados atualmente com o assédio diante do projeto de mineração da empresa Potássio do Brasil na região de Autazes, no interior do Amazonas, ressaltando o aumento de especulações imobiliárias e outros fatores após o anúncio do projeto, o que gerou tensão constante na região onde vivem.
Pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e do Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia relataram os possíveis impactos da mineração na vida aquática, nos peixes amazônicos, uma das principais fontes de alimento de povos indígenas e populações tradicionais, amparados em dados sobre contaminação de áreas e peixes por mercúrio, em especial grandes espécies, bem como sobre o impacto do revolvimento de leito de rios e os riscos para a manutenção do equilíbrio do meio ambiente. As conclusões dos pesquisadores foram embasadas no acompanhamento de diversos povos já impactados negativamente por grandes projetos de mineração e por garimpo no Pará (Barcarena), na região Sudeste (Mariana e Brumadinho) e em outros locais do país.
Indígenas relatam impactos – Durante as falas e perguntas do público, representantes de cooperativas de garimpo defenderam a atividade alegando que a atividade garimpeira não é danosa ao meio ambiente. Lideranças indígenas rebateram esses argumentos, relatando os impactos que suas famílias sofrem nas comunidades, aldeias e rios por causa da atividade de mineração ou garimpo. Falas como “vocês não bebem a água do rio que nós bebemos”, “vocês não vivem lá na aldeia” foram ditas por indígenas no plenário, buscando contrapor a defesa da mineração e do garimpo pelos representantes das cooperativas.
Ainda durante as falas do público, foi lida carta de manifesto da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn) exigindo o respeito à consulta e consentimento prévio, livre e informado dos povos indígenas do Rio Negro em qualquer tipo de atividade ou política pública que venha a afetar suas vidas e territórios. Também foi exibido áudio da deputada federal indígena Joênia Wapichana (RR), contestando o envio pelo Executivo do Projeto de Lei 191/2020.
O representante do MPF, ao final, ressaltou que é importante haver espaços de debates e diálogo, mesmo com opiniões divergentes, contudo, deve haver a premissa de respeito pelo modo de viver de cada povo, suas visões, culturas e tradições, passando esse respeito pela garantia de seus direitos como a já mencionada consulta e consentimento.
Como encaminhamento final da parte da manhã, propôs-se a elaboração de um documento técnico pelas entidades e pesquisadores presentes, trazendo dados sobre o impacto da mineração e garimpo em território amazônico, também sobre povos indígenas e comunidades tradicionais, bem como sobre o desrespeito ao direito de consulta e consentimento diante da apresentação do PL 191/2020 pelo Poder Executivo, sem debate amplo com os povos indígenas e comunidades tradicionais, principais interessados.
Fonte: O vermelho