Nem impeachment, nem CPIs: Lira promete Câmara alinhada a Bolsonaro

Por uma Câmara “chapa-branca”, Lira diz que não é hora para “divisão e acotovelamento”.

Em troca do apoio do governo Jair Bolsonaro à sua candidatura à presidência da Câmara Federal, o deputado Arthur Lira (Progressistas-AL) não deixa mais dúvidas: se eleito, vai barrar não apenas os pedidos de impeachment contra o presidente da República – mas também toda e qualquer comissão parlamentar de inquérito (CPI) que possa atingir o Palácio do Planalto. Com Lira, a Câmara se tornará “chapa-branca”, abertamente alinhada ao bolsonarismo.

Se já era esperado que o parlamentar travasse as ações pró-impeachment, o caso das CPIs sela o acordo. Lira vai agir para proteger os interesses de Bolsonaro e barrar comissões que investiguem o presidente e seus aliados. Uma delas, já em curso, é a CPI das Fake News, que tem como alvo o “gabinete do ódio” e filhos de Bolsonaro. A outra é a CPI da Saúde, proposta para investigar as inúmeras e criminosas falhas do governo na condução da pandemia de covid-19.

Líder do Centrão, Lira condicionou a continuidade da CPI das Fake News à posição da maioria dos colegas. Mas, ao abordar a criação de CPIs de uma forma geral, afirmou que não é hora para “divisão e acotovelamento”. O candidato à sucessão do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), deixou claro também que é contra a CPI da Saúde. “Esse assunto não pode ser motivo de embates políticos para trazermos para a discussão traumas, interrupções bruscas democráticas”.

A eleição que vai renovar a cúpula do Congresso está marcada para a próxima segunda-feira (1º de fevereiro). Lira tem o apoio explícito de Bolsonaro e conta com a ajuda da articulação política do Planalto, que está distribuindo cargos e recursos de emendas parlamentares, em troca de votos.

Na quarta-feira, 27, Bolsonaro admitiu que tem interferido na disputa do Congresso. Após café da manhã com deputados do PSL, no Palácio da Alvorada, ele disse que, “se Deus quiser”, vai “participar e influir na presidência da Câmara”. O PSL é o partido pelo qual Bolsonaro se elegeu, mas se desfiliou um ano e oito meses depois. A sigla está dividida entre Lira e Baleia Rossi (MDB-SP), avalizado por Maia.

Ao contrário de Lira, Baleia é a favor tanto da continuidade da CPI das Fake News como da abertura de uma comissão para se debruçar sobre a crise do coronavírus. “O problema das fake news precisa ser debatido com mais vigor. Em relação à Saúde, todos estamos assistindo a uma série de erros”, diz o deputado. “Se houver apresentação de requerimento com as assinaturas necessárias e fato determinado, não há motivos para não instalar.”

Ataques

Instalada em setembro de 2019, sem o aval do governo, a CPI das Fake News pode ser decisiva para abalar os métodos digitais do bolsonarismo. O colegiado é misto, formado por deputados e senadores, e já identificou que parte dos ataques virtuais contra adversários do Planalto e integrantes do Judiciário veio do computador usado por um assessor do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho “zero três” do presidente.

A CPI anda em paralelo com o inquérito conduzido pelo ministro Alexandre de Moraes, no Supremo Tribunal Federal (STF). As investigações da Corte sobre ameaças, ofensas e notícias falsas espalhadas nas redes sociais contra integrantes da Corte fecharam o cerco sobre o “gabinete do ódio”, grupo de assessores do Planalto comandado pelo vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ).

Integrantes da CPI das Fake News temem que, se eleito, Lira atue para encerrar as investigações, utilizando manobras regimentais. Em abril passado, a comissão teve o prazo prorrogado por mais 180 dias, mas não se reuniu depois disso porque os trabalhos foram paralisados pela pandemia. O combinado é que esse prazo passe a contar após o retorno presencial do Congresso, mas Lira pode obrigar a conclusão dos trabalhos.

“Há um esquema na turma do governo que é, assim que chegar ao poder, esvaziar, acabar com a CPI das Fake News, porque ela pega muita gente. Temos só que saber quem vai ser o pizzaiolo”, afirmou o deputado José Nelto (Podemos-GO), um dos titulares da comissão.

Relatora da CPI, a deputada Lídice da Mata (PSB-BA) disse que a oposição está preparada para defender a continuidade das investigações. “Há muito tempo que essa CPI está no radar do governo. Aliás, ela já se instalou sem apoio do governo. É claro que eu tenho a expectativa de que eles tentem mais uma vez atacá-la. Nós vamos defender”, declarou.

Fonte: O Vermelho