Com Lula candidato ou até mesmo fiador de outra campanha, Bolsonaro deve ser derrotado .

Ex-presidente Lula / Foto: Ricardo Stuckert

Dario Pignotti, editor do Página/12, um dos jornais de maior circulação da Argentina, publicou um texto analisando a conjuntura do Brasil após a notícia de que o ex-presidente Lula é elegível para 2022.

Para o jornalista, com Lula em campo, fortalecido como candidato à presidência ou até mesmo fiador de outra campanha, Bolsonaro deve ser derrotado.

Confira a íntegra abaixo:

Lula de volta. O Supremo Tribunal Federal brasileiro anulou todos os processos contra Luiz Inácio Lula da Silva, que desse modo recuperou seus direitos políticos perdidos com as viciadas condenações de Lava Jato e poderá enfrentar Jair Bolsonaro nas eleições do próximo ano.

O ministro Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, anulou as sentenças contra o ex-presidente por entender que não competia à 13.ª Vara Federal de Primeira Instância de Curitiba, que era o feudo do ex-juiz Sérgio Moro, dar curso a esses processos da Lava Jato. Os casos tramitarão a partir de agora na Justiça Federal de Brasília.

Ficam sem efeito as sentenças carregadas de intenções políticas e carentes de evidências consistentes, pelas quais o dirigente do Partido dos Trabalhadores (PT) teve que cumprir 580 dias em uma cela solitária no quarto andar da Superintendência da Polícia Federal de Curitiba, entre abril de 2018 e Março de 2019.

“Recebemos com serenidade a decisão do ministro Fachin que acatou o habeas corpus que apresentamos em novembro de 2020”, disse o advogado de defesa Cristiano Zanin Martins em nota.

Não está descartado que haja recurso da Procuradoria-Geral da República à decisão de Fachin, submissa à vontade de Jair Bolsonaro, e que a questão seja elevada ao plenário do Supremo composto por onze membros, divididos em duas alas: lavajatistas e antilavajatistas. Ou, se preferir, partidários e opositores de Lawfare e de Sergio Moro.

Fachin, considerado um juiz lavajatista, surpreendeu políticos e magistrados com esta decisão que, como quase todas as do STF, se inspira mais em motivos políticos do que judiciais.

A verdade é que, com a recuperação de seus direitos, o chefe petista conquistou a vitória mais importante após cinco anos de acirrada batalha contra o Lawfare, na qual sempre se afirmou inocente. E chegou mesmo a recusar convites para sair do país ou se refugiar em uma embaixada.

Apesar do tempo de prisão e de ter sido condenado ao silêncio pelas empresas jornalísticas dominantes, ele mantém uma resistente popularidade, como mostra uma pesquisa publicada neste domingo no conservador jornal O Estado, em que seu potencial de votos se situa em torno dos cinquenta por cento, contra 38 por cento de Bolsonaro, com vistas às eleições presidenciais de 2022.

Com Lula em campo, não há outro candidato mais forte para derrotar o regime bolonarista entre as forças democráticas e populares. É prematuro dizer que será candidato pela sexta vez (o foi em 1989, 1994, 1998, 2002 e 2006). Mas ninguém duvida que essa decisão do STF o fortalece seja como candidato à presidência, seja como fiador de um candidato do PT ou de uma eventual frente eleitoral.

A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, sustentou que “a anulação das sentenças atende a um pedido de justiça da sociedade brasileira e da comunidade internacional, da luta de nossa militância e daqueles que acreditaram na inocência de Lula (…) apesar das atrocidades cometidas por Moro”.

Bolsonaro e mercado, contrariados.

Logo após a notícia da restauração dos direitos políticos de Lula ser conhecida, o presidente Bolsonaro acusou o juiz Fachin de manter “fortes laços com o PT” e retomou parte de seu discurso sectário de 2018, garantindo que o “povo” não vai querer voltar a ter um governo de esquerda.

É um discurso repisado, que teve sucesso quando o antipetismo estava no auge, mas de eficácia duvidosa nestes tempos em que o público vivencia em primeira mão as vicissitudes desse governo militar-civil.

A volta de Lula às disputas significa um revés para o Exército, cuja pressão, por meio de seu ex-comandante, o general Eduardo Villas Boas, influenciou a proscrição do líder petista há três anos.

Um ministro militar disse à CNN Brasil na noite de segunda-feira, ocultando sua identidade, que o retorno do PT ao poder “não seria bom para o país”.

O mercado também não se alegrou com a volta do ex-torneiro mecânico, decepção expressa na forte queda de 3,9% na Bolsa de Valores de São Paulo e na alta de 1,6% do dólar. Vale ressaltar que o mercado de ações já operava em queda desde as primeiras horas da tarde e será necessário aguardar os próximos dias para melhor aferir seu comportamento diante do novo cenário político.

Dois Golpes

Surgida em 2014, a operação Lava Jato organizou uma coalizão de forças do campo conservador unidas em busca do fim do ciclo de governos do PT.

As manobras de Moro, amplificadas pela multimidiática Globo, contribuíram para intoxicar o ambiente político e o clima popular, levando ao golpe que derrubou Dilma Rousseff em maio de 2016.

Esse esforço foi apenas o primeiro passo de um plano maior cujo objetivo final do qual era impedir a candidatura em 2018 e o possível terceiro mandato de Lula, processado com base em provas inconsistentes, depoimentos de arrependidos coagidos e manobras articuladas com os procuradores de Curitiba.

Essa associação ilícita, conhecida como “Força Tarefa de Curitiba”, foi desmascarada a partir de julho de 2019, quando o site The Intercept começou a publicar transcrições e áudios das conversas de Moro com o promotor-chefe, Deltan Dallagnol. Não restam dúvidas de que cada movimento visou a que o político permanecesse na prisão e ficasse fora da corrida ao Planalto. Finalmente Bolsonaro foi eleito graças a eleições anômalas, a uma operação que foi a continuação do golpe de 2016 ou o golpe em si. Moro recebeu um bom preço por seu papel na conspiração, sendo nomeado Ministro da Justiça e Segurança por Bolsonaro.

Fonte: Brasil 247