A Conferência Nacional de Educação já vem enfrentando a extrema-direita nos debates, explicam as lideranças de entidades. Conheça os principais desafios da Conferência.
A partir do dia 28, próximo domingo, a capital brasileira se torna o epicentro das discussões sobre o futuro da educação nacional com a realização da Conferência Nacional de Educação (Conae) 2024, que reúne representantes de diversas entidades e movimentos sociais para debater os desafios e perspectivas para os próximos anos. O Portal Vermelho entrevistou líderes de entidades e movimentos que participam dos debates. Eles trazem à tona as expectativas, preocupações e propostas para a construção de um novo Plano Nacional de Educação (PNE).
As lideranças consultadas envolveram entidades de professores, estudantes, pesquisadores, educadores e profissionais da Educação, tais como Vinícius Soares, presidente da ANPG (Associação Nacional de Pós Graduandos), Rui Oliveira, coordenador-geral da APLB (Associação dos Professores Licenciados do Brasil – Seção Bahia), Manuela Mirella, presidenta da UNE (União Nacional dos Estudantes), Jade Beatriz, presidenta da UBES (União Brasileira de Estudantes Secundaristas), Francisca Seixas, secretária de Assuntos Culturais e Educacionais da Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo) e Madalena Guasco Peixoto, coordenadora da Secretaria-Geral da Contee (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino).
A Conae 2024 se configura como um espaço crucial para a construção de diretrizes que nortearão a educação no Brasil nos próximos anos. Os entrevistados enfatizam a importância da participação ativa dos delegados para garantir que o documento final represente uma visão de educação inclusiva e democrática. A mobilização popular é destacada como fundamental para o sucesso da conferência e para fortalecer a educação como política de Estado.
As entidades apresentam diversos pontos convergentes relacionados à Conae (Conferência Nacional de Educação) e aos desafios educacionais enfrentados no Brasil. Abaixo estão alguns dos principais pontos convergentes nas entrevistas:
Período de Desafios e Desmonte:
A importância da Conae após um período de seis anos de desmonte na educação, foi mencionada pelas entidades, que passaram por um período de enfrentamento à extrema direita na educação.
Importância da Educação na Reconstrução do País:
A importância da educação na reconstrução do país, especialmente para formar quadros técnicos de alto nível é citada. A Conae é uma etapa fundamental para avançar na educação pública gratuita e de qualidade, dizem todos.
Enfrentamento à Extrema Direita:
A necessidade de enfrentamento à extrema direita na conferência e posteriormente no Congresso Nacional são tônicas. A Conae é um espaço para retomar foros deliberativos da sociedade civil em meio ao desafio da polarização política.
Financiamento da Educação:
Debater o financiamento da educação, especialmente o eixo 6, para garantir recursos necessários para o cumprimento de metas do PNE comparece como tema convergente.
Avaliação do PNE (Plano Nacional de Educação):
O atual PNE não cumpriu 65% de suas metas e, portanto, é preciso discutir um novo plano.
Atuação dos Movimentos Sociais:
A mobilização da sociedade, incluindo movimentos estudantis, é fundamental para influenciar o Congresso Nacional. A resistência do movimento estudantil nos últimos seis anos evitou um cenário ainda pior.
Desafios no Ensino Superior:
A situação do ensino superior brasileiro, incluindo cortes orçamentários e desafios na qualidade são preocupações das entidades.
Desafios na Regulamentação da Educação Privada:
A necessidade de regulamentação da educação privada, especialmente no contexto da educação à distância é uma urgência pós-pandemia.
Redemocratização da Educação:
A Conae promove a redemocratização da educação brasileira e discute diretrizes para o novo PNE.
Desafios da Extrema Direita e Fake News:
Um dos desafios enfrentados pela Conae é a disseminação de fake news pela extrema direita.
Esses pontos convergentes refletem as preocupações compartilhadas pelos entrevistados em relação à educação no Brasil e à importância da Conae como espaço de debate e deliberação para enfrentar esses desafios.
ANPG na Conae: Marco crucial na reconstrução educacional
O presidente da ANPG destaca a importância da Conae após um período de seis anos de desmonte na educação. Para ele, é crucial debater os desafios para os próximos anos, especialmente na reconstrução do país. Soares ressalta a necessidade de integrar a educação com a ciência para formar quadros técnicos de alto nível, alinhados com os desafios nacionais, como o plano de reindustrialização do Brasil.
Vinícius Soares expressou a importância da Conae como um marco histórico após anos de negligência e desafios enfrentados pela educação brasileira. “Passamos por um período de desmonte nos últimos seis anos, e há muito tempo não tínhamos uma conferência de educação. Agora, é o momento em que o movimento educacional pode se unir para debater os desafios, especialmente no contexto da reconstrução do país”, afirmou Soares.
O pós-graduando enfatizou a relevância da educação como elemento fundamental no processo de reconstrução, destacando a necessidade de formar quadros técnicos de alto nível para enfrentar os desafios nacionais, especialmente diante do plano de reindustrialização proposto pelo governo. “Para garantir a função social da pós-graduação em responder aos desafios imensos do país, é crucial que a educação se transversalize junto com a ciência. Esses são os dois elementos fundamentais na reconstrução do Brasil”, ressaltou Soares.
A expectativa da ANPG é que a Conae proporcione um ambiente propício para o debate e a elaboração de estratégias que possam garantir uma educação estruturada capaz de enfrentar os desafios do país. Soares enfatizou a importância de abordar não apenas questões educacionais, mas também integrar a ciência nesse processo, destacando a necessidade de formação de profissionais de alto nível para contribuir com o plano de reindustrialização.
APLB na Conae: batalha pela reconstrução do sistema educacional
O coordenador-geral da APLB enfatiza a mobilização contra a extrema direita na Conae. Ele destaca que a batalha mais decisiva ocorrerá no Congresso Nacional, onde enfrentarão um cenário conservador. Oliveira ressalta a importância dos eixos da conferência, com destaque para a valorização dos trabalhadores em educação, financiamento da educação e a construção do Sistema Nacional de Educação.
Ele destaca a importância de organizar uma frente conjunta, envolvendo a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e movimentos sociais, para enfrentar as ideias da extrema direita que permeiam a conferência.
“Essa é uma batalha, a primeira batalha é a conferência. Passada a conferência, nós vamos ter que mobilizar os estudantes, o movimento social, a sociedade como um todo, para que o Congresso, que tem uma formação extremamente conservadora, possa garantir nossas proposições avançadas para a educação pública gratuita e de qualidade”, afirmou.
O sindicalista ressaltou que a Conae servirá como um espelho para o projeto de lei que é o Plano Nacional de Educação, o qual será encaminhado ao Congresso Nacional. Oliveira enfatiza a necessidade de ganhar a opinião pública para as propostas avançadas, já que o Congresso é dominado pelo Centrão e outros setores conservadores.
“Se a gente ganhar a opinião pública e for para as ruas, para melhorar e garantir a autoestima da tropa, a gente precisa ganhar logo essa batalha também na conferência. Uma batalha importante, ocorre na conferência, onde os debates serão mais de conteúdo, e a batalha no Congresso Nacional, que é uma batalha de ganhar opinião pública para que a educação saia do papel, dessa do palanque e seja realidade nacional”, destacou Oliveira.
A conferência será realizada em sete eixos, sendo que o eixo 5, referente à valorização dos trabalhadores em educação e gestão pública de qualidade, é o que mais chama a atenção. Oliveira, que foi palestrante nesse eixo, destaca a importância de abordar também os eixos 2 (financiamento da educação) e 6 (construção do Sistema Nacional de Educação).
“Não adianta discutir tudo em educação se não tiver financiamento pra isso. Onde é que tem dinheiro pra fazer tudo o que nós queremos?”, questionou Oliveira.
O dirigente sindical ressalta a importância do financiamento para a implementação de propostas voltadas à valorização dos profissionais da educação, formação contínua, infraestrutura escolar e combate ao analfabetismo. Ele denuncia cortes significativos nos investimentos em educação nos últimos anos, e destaca a urgência em reverter esse quadro para garantir a reconstrução do sistema educacional brasileiro.
UNE na Conae: em defesa da educação e da democracia
A presidente da UNE destaca a relevância da Conae como espaço de participação popular. Com o governo Bolsonaro atacando a educação e a ciência, Mirella ressalta a resistência dos estudantes. Ela destaca a preocupação com o ensino superior, a falta de investimento e a crescente privatização, defendendo a necessidade de uma regulação rigorosa.
A líder estudantil destacou o papel crucial da UNE, especialmente após anos de resistência diante de ataques diretos ao movimento estudantil e à educação pública no Brasil. “A Conae é um espaço de extrema importância de participação popular, para que as entidades, a sociedade civil, consigam interferir no projeto nacional de educação que serve ao nosso povo. Especialmente para a UNE, que nos últimos seis anos enfrentou muitos desafios, indo às ruas, defendendo nenhum direito a menos, resistindo aos ataques diretos, inclusive do governo Bolsonaro, que colocou os estudantes como seu principal inimigo”, afirmou Mirella.
Ao destacar a descredibilização da ciência e os ataques à universidade, a presidente da UNE enfatizou que os “tsunamis da educação”, liderados pelos estudantes, mostraram a resistência do movimento. Agora, com um governo eleito que a UNE caracteriza como de “frente ampla”, Mirella destaca o papel do movimento social em garantir a efetivação do projeto nacional de educação, aprovado nas urnas.
“A discussão fundamental este ano é o novo Plano Nacional de Educação (PNE). O último PNE não teve nem metade de suas metas atingidas. Esse plano será central nesta CONAE, e estamos organizados, levando uma bancada de estudantes de todo o Brasil para participar da Conferência Nacional de Educação, para que possamos participar dos debates”, ressaltou Mirella.
A presidente da UNE expressou sua preocupação com a situação do ensino superior brasileiro, mencionando a redução do orçamento para as universidades, especialmente as públicas, e a falta de regulamentação e fiscalização adequadas nas instituições privadas. Ela destacou que é dever do Estado garantir uma educação emancipadora e ressaltou a necessidade de combater a predominância do ensino superior privado.
“A nossa meta da Conae também é sair com uma boa resolução da regulamentação do ensino superior privado. É fundamental para os estudantes acompanharem isso”, concluiu Mirella.
Com a participação ativa da UNE na Conae 2024, a expectativa é que as discussões sobre o novo Plano Nacional de Educação sejam conduzidas com seriedade, visando à construção de um sistema educacional mais justo, inclusivo e comprometido com a formação integral dos cidadãos brasileiros.
UBES na Conae: pautar a educação que queremos
A presidente da UBES destaca a importância da Conae para retomar os fóruns deliberativos da sociedade civil, onde estudantes, professores e profissionais da educação podem expressar suas demandas e contribuir para os rumos da educação brasileira. Jade Beatriz coloca como pautas emergentes a revogação do novo ensino médio, alimentação gratuita nos institutos federais e o acesso à universidade. A campanha “IFES Sem Fome” é destacada como parte dos esforços para garantir uma educação mais justa.
“A Conferência Nacional de Educação tem esse principal motivo de importância, por retomar esses foros deliberativos da sociedade civil, onde estudantes, professores, profissionais de educação podem participar e colocar quais são as principais demandas da educação brasileira. Não só a educação básica, mas também a educação superior, apontando os rumos que precisamos tomar para resolver os problemas e desafios que estão colocados. Além disso, é um local que fortalece a democracia”, destacou Jade.
A líder estudantil salientou que, neste ano, os debates na Conae devem girar em torno de questões emergentes, como a revogação do Novo Ensino Médio e a busca pela alimentação gratuita nos institutos federais, uma das principais pautas da entidade. A campanha “IFES Sem Fome” tem sido central nesse sentido, buscando sensibilizar para a importância da garantia de alimentação nos institutos federais.
“Para além disso, também é o acesso à universidade. A UBES tem suas pautas, e estamos indo com tudo. Já conversamos com vários deputados e agentes da educação que estão junto conosco na campanha. Eles serão estratégicos para tornar essa Conferência Nacional de Educação um instrumento para concretizar o projeto de país que queremos, mais justo, através da educação básica, da escola pública e da democratização do ensino superior”, ressaltou Beatriz.
Com as pautas claras da UBES, a expectativa é que a Conae 2024 seja um espaço para discussões significativas, envolvendo não apenas a revogação do novo ensino médio e a alimentação nos institutos federais, mas também abordando o acesso à universidade e a democratização do ensino superior como elementos-chave para a construção de um sistema educacional mais inclusivo e equitativo para o Brasil.
Apeoesp na Conae: lutas e perspectivas para a educação pública
A secretária de Assuntos Educacionais e Culturais da Apeoesp destaca a luta em São Paulo por condições dignas de trabalho e respeito ao piso salarial. Francisca enfatiza a necessidade de um novo Plano Nacional de Educação para os próximos 10 anos, visando uma educação pública de qualidade. Ela destaca a importância da Conae para fortalecer a educação pública como política de Estado.
Em São Paulo, a Apeoesp tem travado uma intensa batalha pelo respeito ao piso nacional salarial dos professores, condições democráticas de trabalho e a implementação de um plano de carreira sério, que incentive a formação contínua e permanente. Francisca destaca a necessidade de um secretário da Educação comprometido com a educação pública, criticando a visão privatista de Renato Feder.
“Em São Paulo, lutamos intensamente pelo respeito ao piso nacional salarial, condições democráticas de trabalho, plano de carreira sério e estruturação das escolas para um bom desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem. Essas são lutas essenciais para proporcionar uma educação de qualidade”, afirma, destacando a importância de enfrentar desafios imediatos para construir um futuro educacional mais justo e igualitário no Brasil.
“Aprovar um novo Plano Nacional de Educação para os próximos 10 anos com metas ousadas é essencial para o país ter uma educação pública que o povo brasileiro merece e o país necessita”, enfatiza ela. Nesse contexto, a Conae 2024 assume um papel fundamental para fortalecer a educação pública como política de Estado e avançar na criação de um Sistema Nacional de Educação que respeite as regionalidades e a diversidade humana.
A secretária da Apeoesp ressaltou a violência enfrentada pelos profissionais da educação nos governos de Temer e Bolsonaro, destacando perseguições por extremistas de direita e fundamentalistas religiosos. Nesse sentido, a Conae também se torna um espaço crucial para debater como levar paz para as escolas, promover a gestão democrática e envolver as famílias no ambiente escolar.
Contee na Conae: marco da reconstrução da educação democrática
A coordenadora da Secretaria-Geral da Contee destaca a reconquista do Fórum Nacional de Educação após desafios nos governos anteriores. Madalena enfatiza que a Conae 2024 é extraordinária e urgente devido ao vencimento do Plano Nacional de Educação em 2024. Ela ressalta a necessidade de mobilização popular para construir um novo projeto de redemocratização da educação brasileira.
A não realização de metas cruciais, como a ampliação de vagas nas instituições públicas, é ressaltada por Madalena. A desregulamentação da educação à distância no setor privado e a possível criação de uma agência reguladora de educação superior privada são temas de debate acalorado.
A disseminação de fake news e a inserção da extrema direita no contexto da conferência são obstáculos a serem superados. A regulamentação da internet e a sustentabilidade ambiental também emergem como temas relevantes, integrando o debate educacional. “No grupo de trabalho que discutiu a violência nas escolas, a gente sabe como é que está sendo manipulado, como é que essa internet desregulada tem agido inclusive como instrumento da ultradireita para aliciar jovens, sem controle nenhum, sem regulamentação”, afirma.
Uma das primeiras questões abordadas por Madalena foi o resgate do Fórum Nacional de Educação, destituído no governo Michel Temer e esvaziado posteriormente pelo governo Bolsonaro. Ela destacou a luta para recuperar esse espaço democrático e representativo, culminando no resgate pelo governo Lula nos moldes originais, com a participação de diversas entidades.
Madalena ressaltou que o PNE atual não cumpriu 65% de suas metas, tornando essencial um amplo debate para discutir as diretrizes do novo PNE de maneira democrática e participativa. A Conae representa, assim, um marco na retomada da mobilização popular para debater o futuro da educação no Brasil, destacando a importância da reconstrução da educação democrática.
Ela ressaltou que, apesar da diversidade de mesas temáticas durante a conferência, o objetivo primordial é alinhar-se ao propósito central da Conae para evitar desvios de foco e favorecer temas paralelos e diversionistas, especialmente com as ameaças que surgem por parte de setores de extrema-direita.
Um dos temas abordados foi a não realização de metas cruciais estabelecidas anteriormente, como a ampliação de 40% das vagas nas instituições públicas ao longo de uma década. Madalena destaca a desregulamentação da educação à distância, principalmente no setor privado, como uma resposta inadequada e prejudicial a essa falta de avanço.
“A desregulamentação da educação à distância, privada, de grupos de capital aberto, ampliaram seu escopo, através de cursos de péssima qualidade. Então, claro, está articulada a ideia da não ampliação das vagas públicas com o fortalecimento de uma educação privada de capital aberto. Esse foi o jogo deles”, explicou ela.
Outro tema estratégico é a possível criação de uma agência reguladora de educação superior privada, proposta que gerou controvérsias e motivou manifestações contrárias em alguns estados. “Surgiu na mídia que o ministro da Educação queria fazer uma agência reguladora de educação superior privada. Agência reguladora não é regulamentação do Estado. Então a gente conseguiu em alguns Estados tirar uma manifestação contrária a essa posição”, ressaltou Madalena.
Fonte: O Vermelho